terça-feira, 6 de novembro de 2012

Para Fernando Passos...

Há versos meus escritos nos teus olhos. Eu, que sempre tive medo que a poesia me escapulisse – como aquelas cartas que são colocadas em garrafas e lançadas ao mar e nunca chegam ao seu destino – encontrei versos meus nos teus olhos. Fora de mim, em ti. Logo eu que, dentro do meu equilíbrio e ingenuidade, acreditava em sentimentos comedidos e tangíveis, descobri um universo de coisas infinitas escondidas nos teus olhos. Nas tuas pupilas dilatadas que me convidam a uma paz que não existe, mas que eu vou porque sempre fui teimosa mesmo. Poesia. É o que fazemos de melhor. É poesia o que tento fazer agora, nessas linhas tortas de palavras erradas e cheias de metáforas, porque nem sei bem o que o lado de dentro tá dizendo. Me incomoda por inteira a necessidade desses versos que se entranham em minha alma e escorrem pelos meus dedos apenas para denunciar coisas nossas, tão particulares quanto aquelas conversas de sábado à tarde. Minha liberdade mora nas palavras, você sabe. E veja que estranho: há palavras minhas nos teus olhos. Nesses olhos embriagados de uma loucura que eu desconhecia e que desperta vontades que pareciam estar a vida toda adormecidas em mim, enclausuradas. Encasuladas. É no querer que a gente se confunde. Nada de almas gêmeas, porque nós somos almas inteiras. Duas. É nesse mesmo querer que a gente se perde e se encontra de novo. E o que é isso? Esse algo maior – dentro ou fora, não sei. Esse incômodo que transborda insistentemente, o que é? A falta de sossego. O desejo latente de roubar os teus olhos pra mim. A ânsia de aprender a usar as asas imaginárias, por se saber essencial voar. Esse ritmo diferente dentro, essa força estranha fora. Isso, o que é? Não. Por favor, não tente me responder. Qualquer que seja a tua resposta pode soar imprópria, fugaz. Apenas me deixa ficar aqui, lendo nos teus olhos reticentes trechos do livro que ainda não escrevi. Poesia de corpos. Me deixa começar a perceber que o que há em comum entre nós não é apenas um monte de matéria presa que delineia formas, mas o liame daquilo que não se explica. Se sente. Me deixa brincar de infinitude e não terminar esse poema texto. Melhor: me deixa construir o final que eu quiser. E assim eu vou colocando reticências nos meus devaneios. Em nós. O quereres e o estares sempre a fim do que em mim é em mim tão desigual Faz-me querer-te bem, querer-te mal. Bem a ti, mal ao quereres assim Infinitivamente impessoal. E eu querendo querer-te sem ter fim E, querendo-te, aprender o total do querer que há e do que não há em mim Caetano Veloso – O Quereres.

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